Fonte: Administração Apostólica Pessoal São
João Maria Vianney. Vivendo a Quaresma. Campos dos Goytacazes – RJ: Edições
Apostólica, 2010.
1 – A essência da perfeição cristã consiste
na união com Deus por meio da caridade. Mas, enquanto a caridade, conformando a
nossa vontade com a vontade divina, nos une a Deus, o pecado grave, opondo-se
diretamente à vontade de Deus, produz o efeito contrário. Por outras palavras,
a caridade é a força que une o homem a Deus, e o pecado é a força que o separa
de Deus.
[Pausa...]
O pecado grave é, assim, o maior inimigo da
vida espiritual, pois não só atenta contra ela, mas destrói-a nos seus
elementos constitutivos, caridade e graça. E esta destruição, esta morte
espiritual, é a inevitável consequência do pecado, ato com que o homem se
separa voluntariamente de Deus, única fonte de vida, de caridade e de graça.
Como o ramo não pode viver separado do tronco, assim a alma não pode viver
separada de Deus.
[Pausa...]
Se Deus, como causa de todo o ser, está
sempre presente na alma do pecador – do mesmo modo como está presente em todas
as coisas – contudo não está como Pai, como Hóspede, como Trindade que Se
oferece à alma como objeto de conhecimento e amor. Assim a alma, criada para
ser templo da Santíssima Trindade, tornou-se voluntariamente incapaz de viver
em sociedade com as três Pessoas divinas, fechou ela própria o caminho para a
união com Deus e, por assim dizer, constrange Deus a cortar as relações de
amizade com ela. E tudo isto por ter preferido o bem limitado e caduco duma
criatura miserável, duma satisfação egoísta, dum prazer terreno, ao sumo Bem
que é Deus. Eis a malícia do pecado, que repudia o dom divino, que atraiçoa o
Criador, o Pai, o Amigo.
[Pausa...]
2 – Se quisermos compreender melhor a malícia
do pecado mortal, devemos considerar os seus efeitos desastrosos. Um só pecado
transformou Lúcifer, num instante, de anjo de luz em anjo das trevas, em
inimigo eterno de Deus. Um só pecado destituiu Adão e Eva do estado de graça e
de amizade com Deus, privando-os de todos os dons sobrenaturais e
preternaturais, condenando-os à morte e, com eles, toda a humanidade. Um só
pecado bastou para cavar um abismo entre Deus e os homens, para impedir ao
gênero humano toda a possibilidade de união com Deus.
[Pausa...]
Porém, mais que tudo isto, a Paixão de Jesus
diz-nos a grande malícia e a força destruidora do pecado. Os membros
dilacerados de Cristo e a Sua dolorosíssima morte de cruz dizem-nos que o
pecado é uma espécie de deicídio. Por causa dos nossos pecados, Jesus, o mais
formoso dos filhos dos homens, tornou-Se “desprezado, o último dos homens, um
homem de dores... Foi ferido por causa das nossas iniquidades” de tal modo que
“desde a planta do pé até ao alto da cabeça não há nele nada são” (Is 53, 3-5;
1, 6). O pecado martirizou Cristo e conduziu-o à morte, mas no entanto, Cristo
foi para a Paixão e para a morte “porque ele mesmo quis”, porque com Sua morte
quis destruir o pecado e restabelecer o homem na amizade divina.
[Pausa...]
Jesus, nossa Cabeça, convida-nos a nós, Seus
membros, a associarmo-nos à Sua obra destruidora do pecado: destruí-lo em nós
até às suas mais profundas raízes, ou seja, nas suas más tendências, e
destruí-lo também nos outros membros. Esta é uma lei de solidariedade, pois que
o mal de um é o mal do outro porque cada pecado pesa sobre todo o mundo e tenta
deslocar o seu eixo de Deus. Por isso cada cristão – especialmente a alma
consagrada a Deus – deve sentir-se profundamente interessado nesta luta contra
o pecado e deve combatê-lo com os meios apropriados: com a penitência, com a
oração expiatória e sobretudo com o amor. O amor de caridade, se é perfeito,
destrói melhor o pecado que o fogo do purgatório, mesmo sem manifestação
externa. Eis porque todos os santos puderam converter tantas almas; Deus
serviu-Se do fogo da sua caridade para destruir o pecado nos pecadores.
[Pausa...]